quinta-feira, 3 de maio de 2012

Proposta de tradução da primeira parte de "The Seven Sneezes"

 
Havia uma vez um coelhinho, uma gatinha (1) e um cão (2) que viviam juntos num quintal.
O coelhinho era castanho, com grandes orelhas fofinhas. A gatinha era preta, e como todas as gatinhas tinha umas orelhinhas pequeninas. O cão era um enorme cãozarrão que soltava um poderoso “ão-ão”.
            Eram todos felizes, todos contentes. O coelhinho adorava as suas orelhas grandes, a gatinha sentia-se feliz por tê-las pequeninas, e o cão orgulhava-se do seu poderoso “ão-ão”. (3)
Um dia chegou numa velha carroça um homem que fazia negócio com ferro- velho. “Quem tem trapos? Quem tem trastes / tralha (4)” cantava o homem da carroça. O dia estava fresco. O homem da carroça começou a espirrar....
-       Quem tem tra...a...a....ah.....
O coelhinho, a gatinha e o cão sustiveram todos a respiração até que o homem da carroça terminasse o espirro:
– A... tchim! A... tchum....! A.... tcha-tchão!
      Foram três espirros valentes. Tão valentes que o homem da carroça foi lançado num sopro até desaparecer estrada abaixo... com a carroça e o cavalo e tudo!
– Pela minha santinha! (5) – disseram um ao outro o coelhinho, o gatinho e o cão. E depois viram que uma coisa estranha tinha acontecido.
O gatinho preto tinha as orelhas grandes do coelhinho.
E o coelhinho castanho tinha as orelhinhas pequeninas do gatinho.
             – Ora que tolos que vocês parecem – disse o cão.
      Mas foi então que também ele se sentiu tolo. Porque, quando abriu a boca, não lhe saíu nenhum poderoso “ão-ão”, e a sua voz era só um débil miau.
      Pela minha santinha digo eu! – exclamou a gatinha (6).
Mas estas palavras saíram-lhe num terrível e poderoso ão-ão! E até (6) caiu de costas, de tão espantada que estava de se ouvir a ladrar. E foi então que viu as suas orelhinhas pequeninas na cabeça do coelhinho onde deviam estar umas orelhas grandes!
–Dá-me já as minhas orelhas! (7) – ladrou a gatinha.
– Dá-me já as minhas orelhas! – guinchou o coelhinho.
E o cão só sabia correr às voltas, a miar que nem um gato!
O coelhinho ficou com soluços de tão transtornado (8) que estava.
– Foi por causa dos.... hic—hic! (9)... atchins... que ficámos.... hic––hic!... assim!

Dificuldades
(1)            “the cat” aparece mais à frente referido no texto como “she”; embora isto seja comum, sobretudo em inglês americano, quando se quer falar genericamente de um gato animal de estimação de que não se conhece o sexo, optou-se por aproveitar a deixa a bem da diversidade de géneros, um assunto mais premente no nosso tempo do que em 1948, quando a obra foi originalmente escrita
(2)            diminutivos e aumentativos são importantes na literatura infantil, para identificação e comparação da criança
(3)            Necessidade de consistência para manter discurso formulaico e memorizável (coelhinho castanho, gatinho preto, orelhinhas pequeninas, orelhas grandes / longas...) teeny ears / long ears / great big bark / brown bunny / black kitten
(4)            Familiaridade – rag man (“homem dos trapos”? / ferro velho / homem da carroça... ver também sonoridade aprazível
(5)            Idiomatismo das interjeições afectivas... efeitos de humor (“Goodness gracious” – também hipótese de “co’a breca” / valha-me Deus)
(6)            predominância de exclamações e ênfase, há que ser consistente com hipótese anterior
(7)            credibilidade da linguagem informal nas relações interpessoais, adequadas à faixa etária  “Give me back my ears!” – “Devolve-me as minhas orelhas” ou “Dá-me já as minhas orelhas”
(8)            vocabulário simples (upset – perturbado?)
(9)            onomatopeias – não temos onomatopeias para soluços

4 comentários:

  1. Não encontrei nenhuma onomatopeia convencionada para soluço. A mais utilizada é "hic" ou "ic" mas não sei se seria de pensar em usar algo como "sluc!" para ser mais parecido com a ortografia do português.

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  2. Normalmente as histórias infantis começam por "Era uma vez ...". Penso que esta seria a opção correcta para "There were once ..." e não "Havia uma vez ...", que causa estranheza.

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  3. Na aldeia dos meus pais, onde cresci, costumava vir "o homem do ferro-velho" recolher, de porta em porta, a tralha que toda a gente amontoava, desde ferro-velho a jornais. Concordo com as opções ferro-velho e tralha.
    Para a expressão de espanto "Goodness gracious" escolheria "Meus Deus!" ou "Valha-me/nos nossa senhora".

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  4. "disseram um ao outro o coelhinho, o gatinho e o cão", não será plural? - "disseram uns aos outros".

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