Ao longo do tempo, Virginia Wolf e os seus colegas encontraram algumas respostas para a sua questão – não respostas normativas, mas respostas radicalmente descritivas – observando os próprios leitores, o narrador e o processo que se obtém entre os mesmos. Quando um leitor enceta um texto são várias as tarefas a desempenhar. Uma dessas tarefas é procurar o “leitor implícito” mais frutuoso para cada texto, escolhendo entre os inúmeros possíveis leitores o mais promissor para esta história, romance ou poema. No seu trabalho seminal, The Rhetoric of Fiction, Wayne Booth explica que “a distinction must be made between myself as a reader and the often very different self who goes about paying bills, repairing leaky faucets, and failing in generosity and wisdom. It is only as I read that I become the self whose beliefs must coincide with the author’s.” Um leitor pode adotar várias abordagens interpretativas para um texto, tal como um médico pode mobilizar várias abordagens terapêuticas para um paciente. O leitor especializado ou médico aprende a selecionar um intérprete que se coaduna com um determinado texto ou um paciente específico – por exemplo, alguns textos requerem um leitor clemente em vez de um leitor cético e alguns pacientes carecem de um médico autoritário em vez de um colegial. Desenvolver competências enquanto leitor ou médico implica conhecer quais dos inúmeros registos se deve assumir para lidar com uma situação interpretativa. O(a) leitor(a) adota o seu padrão de leitura perante a obra – em parte baseado na composição e comportamento do narrador, mas também na sua própria composição e no seu próprio comportamento – que a irá alterar. Uma pessoa sentimental não vai compreender a selvageria de Thomas Pynchon. Uma pessoa obsessiva poderá ser incapaz de render-se às viagens metafóricas de W.G. Sebald. Conclui-se, então, que cada leitura é singular e baseia-se nesta união entre o narrador e o leitor.
Os leitores não são entidades estáticas ou únicas. Lionel Trilling recorda-nos como a nossa apreciação das histórias muda à medida que amadurecemos: “A real book read us. I have been read by Eliot’s poems and by Ulysses and by Remembrance of Things Past and by The Castle for a good many years now, since early youth. Some of these books at first rejected me; I bored them. But as I grew older and they knew me better, they came to have more sympathy with me and to understand my hidden meanings.” Deste modo ligeiro, Trilling dá voz ao poder dos livros para nos lerem, nos alterarem e se tornarem forças reais nas nossas vidas. Leitores inexperientes – na maioria das vezes os estudantes de medicina e profissionais da saúde que frequentam os nossos seminários estão a ler cuidadosamente pela primeira vez – ficam impressionados por observar o seu armazém de histórias aumentar. Apercebem-se que as histórias se influenciam entre si, quase como se as obras de Flanery O’Connor falassem com as histórias de Richard Wright e as de Tony Morrison falassem com as de Faulkner, no interior do leitor enquanto indivíduo. Aquilo a que os académicos literários designam por “intertextualidade” é apenas este poder das histórias partilharem significados com os seus vizinhos. Os estudantes descobrem que as histórias, quando lidas verdadeira e habilmente, entranham-se nos ossos e têm algo a dizer naquilo que pensam e no que fazem, e em última instancia, naquilo que são. O modelo de Arthur Frank “thinking with stories” é proclamado no início deste processo e nós, professores na área da medicina, somos as felizes parteiras nesta mudança de vida.
Andreia Caeiro
N.º 46947
Os leitores não são entidades estáticas ou únicas. Lionel Trilling recorda-nos como a nossa apreciação das histórias muda à medida que amadurecemos: “A real book read us. I have been read by Eliot’s poems and by Ulysses and by Remembrance of Things Past and by The Castle for a good many years now, since early youth. Some of these books at first rejected me; I bored them. But as I grew older and they knew me better, they came to have more sympathy with me and to understand my hidden meanings.” Deste modo ligeiro, Trilling dá voz ao poder dos livros para nos lerem, nos alterarem e se tornarem forças reais nas nossas vidas. Leitores inexperientes – na maioria das vezes os estudantes de medicina e profissionais da saúde que frequentam os nossos seminários estão a ler cuidadosamente pela primeira vez – ficam impressionados por observar o seu armazém de histórias aumentar. Apercebem-se que as histórias se influenciam entre si, quase como se as obras de Flanery O’Connor falassem com as histórias de Richard Wright e as de Tony Morrison falassem com as de Faulkner, no interior do leitor enquanto indivíduo. Aquilo a que os académicos literários designam por “intertextualidade” é apenas este poder das histórias partilharem significados com os seus vizinhos. Os estudantes descobrem que as histórias, quando lidas verdadeira e habilmente, entranham-se nos ossos e têm algo a dizer naquilo que pensam e no que fazem, e em última instancia, naquilo que são. O modelo de Arthur Frank “thinking with stories” é proclamado no início deste processo e nós, professores na área da medicina, somos as felizes parteiras nesta mudança de vida.
Andreia Caeiro
N.º 46947
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